segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Crônica

A compra

Miguel de Adolfo pisou no batente da porta da loja “A Sertaneja” e ficou ali, parado, passeando os olhos pelos produtos, até esbarrá-los na seção dos eletros. Puxou a esposa Severina pelo braço e apontou: T’ali o bichão!
Há tempos que vinha planejando a compra daquele aparelho. Foram meses de economia. Um trocado aqui, outro ali. A aquisição só se tornaria possível, graças à venda do bode “Preguiça” e da cabra “Vidinha”. Agora com o dinheiro inteirado iria finalmente realizar seu sonho de consumo: aquele rádio “ABC, A Voz de Ouro”.
Um vendedor aproximou-se sorridente e prestativo, já que o deslumbramento de Miguel diante do objeto estava dando nas vistas. __Interessado no rádio, senhor? Ora se não estava. Tinha vindo decretado a Mossoró só para comprar o produto!? Inclusive já havia encomendado uma mesinha a Silvinha da serraria para o suporte e uma toalha bordada a Maria Bengobengo para o enfeite. Havia combinado também com Severina a localização no ambiente da sala, entre a cristaleira e o oratório de Nossa Senhora da Conceição. Ia ficar uma beleza.
O rapaz da loja esmiuçou as vantagens do equipamento. Tintim por tintim. Miguel quis saber: __pega com carrego? - carrego é pilha ou bateria na língua dos agrestes. Escutou que ele funcionava tanto com pilhas, quanto com energia elétrica. Miguel procurou a esposa com o olhar e recebeu dela um gesto de aprovação. __Vou levar!
O vendedor testou e encaixotou o produto. Miguel pagou, botou a caixa debaixo do braço e saiu satisfeito com seu “ABC, A Voz de Ouro”, a maior aquisição de sua vida.
Já na calçada lembrou-se que o moço tinha lhe dito que as pilhas não acompanhavam o equipamento.
__Ei moço! E os carregos? Eu compro aonde?
O rapaz saiu da loja e apontou indicando.
__Ali na Paraíba! Estava fazendo uma alusão ao bairro mossoroense homônimo do estado vizinho.
Miguel arribou para a estação com “Virina” – nome que dava carinhosamente à esposa – e pegou o trem às três e meia da tarde rumo a Gov. Dix-sept. Chegando lá, Miguel nem fez menção de sair do veículo. Sentado estava, sentado ficou. E diante da inquietação de Severina, foi enfático:
__Tu vai pra casa, fica com os meninos, que eu preciso ir a Sousa comprar os elementos desse rádio!



 Zenóbio Oliveira



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