domingo, 28 de novembro de 2010

Relíquia

Em 1985 tivemos a maior cheia da história do Rio Apodi/Mossoró. Morávamos no sitio Aguilhadas, em Gov. Dix-Sept Rosado e a nossa casa ficou submersa nas grandes enxurradas de 11 de abril e 17 de maio. Dois dias antes da água cobrir nossa casa meu pai, conhecido no lugar como Chico Carlos professor, escreveu um texto de desabafo e que estava escondido nos baús lá de casa. Revirando esses baús encontrei esse texto e reproduzo aqui esse desafogo emocional do meu pai. 



Hoje são 9 de abril de 1985. É um dia de grande apreensão. Mesmo assim não estou preocupado, mas tomando minhas providências, porque já estou bem baseado com esses tipos de inverno. Sei, por experiência própria, quando vai inundar. Já passamos por dezenas de aperreios, alguns bem grandes: 1961, 1965, 1967, 1974, 1975, 1980 e agora passamos por mais este, 1985. Já fiz a mesma casa três vezes, quase no mesmo lugar. A conta é só mesmo três. Se tiver que passar pra quatro, tem que mudar. Aqui onde moramos, não dá mais para morar gente, já deu, hoje só serve pra morar cururu, pois que esses animais já se apoderaram das nossas casas desde o verão, aliás, isso foi o primeiro prenúncio. Hoje, 9 de abril, há notícias de um absurdo número de chuvas nas cabeceiras do rio Apodi e não vai ficar só nesses. Daqui para 31 de maio outros se seguirão, a pisada é essa. Mas, como disse, não estou mais preocupado, é que agora já perdi o medo, com todas as angústias que vivi no passado por conta de enchente, já me acostumei. Disparei pra fora de mim toda a carga de emoção que estava sentindo e agora sou um homem que que só teme a miséria enquanto ela não vem, porque depois que ela chega meu amigo, eu faço como diz Chico Jurema:
__Beleléu!

Francisco José de Oliveira
Professor aposentado

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