Zenóbio Oliveira
Cuidado com os pardais!
A advertência vem da palavra, da oralidade
que, pelo repertório da experiência, remete ao sentido uma outra forma de
expressão, a escrita, num letreiro gravado em pequenas placas fixadas nos
portões de residências, onde se alerta para outro tipo de animal, digamos,
muito mais feroz: Cuidado com o cão!
Esse cuidado escrito é sempre levado em consideração. O cão é animal perigoso, com raras exceções. Alem disso, a legenda na tabuleta não revela nem a qualidade, nem a condição atual do canino. O outro cuidado desdenhamos, até porque o pardal
é um bicho inofensivo, inclusive para os insetos, pois se alimenta de grãos e migalhas
humanas.
A ave em questão, porem, não é um
passeriforme voante e canoro não. Trata-se de um vigilante atento, imoto,
calado e matemático, com enorme poder de fogo, ou de flash. Como seu homônimo, passer domesticus, é ubíquo em regiões habitadas
pelo homem e também se alimenta de suas migalhas. Espalhados em pontos estratégicos,
e agora sem aviso prévio de sua presença, esses passarinhos tecnológicos são capazes
de papar para seus donos (o estado e empresas agregadas suas) mais de dois
bilhões de reais por ano.
É amigo, esse bichinho eletrônico come alto e tem papo grande. "Pássaro" atento e ativo com poder de vigiar e punir, a serviço de uma indústria, convertida em sistema
e cada vez mais poderosa, a indústria da multa.
Ademais, essa “ave” deve ser compreendida e
aceita como máquina dotada de personalidade, pois do contrário, transgrediria a
regra básica do direito administrativo, preconizada no artigo 280 do Código
Nacional de Trânsito, que imputa competência para “lavrar o auto de infração ao
servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado
pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua
competência”.
Especialmente para o motorista, que convive diariamente
com alertas dessa natureza, podemos acrescentar mais alguns: cuidado com os
buracos; cuidado com o motorista mal educado e estressado; cuidado com a
carestia dos DETRAN’s; cuidado com o assalto na rua, na oficina e na bomba de
gasolina; cuidado com os engarrafamentos; cuidado com a falta de sinalização;
cuidado com a escuridão; cuidado com os animais na rua e nas estradas; cuidado
com a carroça, com a bicicleta, com a moto; cuidado com a pedra solta do
calçamento; cuidado, cuidado, cuidado...
E quando for entrar em casa, cuidado com o
cão, se for sair dela, cuidado com os pardais.