A
VELHICE É UM DÉBITO QUE A IDADE
PODE
ATÉ PRORROGAR, MAS NÃO DISPENSA
Raimundo
Nonato e Nonato Costa
Na vertente
do olho a lágrima mina
E sem
reserva de cálcio a junta estala
Tem a
voz cavernosa quando fala
E uma
letra ilegível quando assina
Quando
o músculo enfraquece a pele afina
E sobre
as veias o sangue se condensa
A saúde
apresenta uma licença
E a
beleza aposenta a vaidade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Como
um Banco Central o tempo é
Todo
ano pra nós libera um lote
Não aceita
ninguém dando calote
Nem fazendo
empréstimo de má fé
Classe
média, elite ou a ralé
Todos
passam no crivo da sentença
O pior
reajuste o da doença
A maior
inflação a da saudade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Não tem
roupa que sirva como adorno
Nem sessão
de botox que lhe ajude
Na CPMF
da saúde
A velhice
jamais faz um estorno
Da BR
do fim não tem retorno
Pra idade
não tem convalescença
E uma
légua de tempo é tão extensa
Que uma
vida só anda uma metade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Esta
nossa epiderme é só a capa
Este
nosso esqueleto só tem osso
Quem
escapa da morte enquanto é moço
Quando
chega a velhice não escapa
Quando
almoça uma sopa janta papa
Olhos
fundos, mãos trêmulas, pressão tensa
Tem dos
filhos total indiferença
E vê
dos netos desprezo e má vontade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Quanto
mais a idade se prorroga
Mais
ao corpo cansado Deus castiga
O perímetro
do sonho o pranto irriga
E a
maré da saudade nos afoga
Prao
abismo sem mãos a morte joga
E sem
usar compressor o tempo imprensa
Excluído
da sorte de nascença
Quem
se cria não tem felicidade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Taxa
esdrúxula que chega a mil por cento
Sem constar
em cartório o título vale
Um minuto
de riso se equivale
A um
dia de lágrima e sofrimento
A amnésia
atacando o pensamento
Não existe
remédio que lhe vença
Nossa
vida longeva nem compensa
Que a
saúde prescreve a validade
A velhice é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Para
todos o tempo é um juiz
E cada
réu que não tem tempo ao alcance
Vai ouvir
do destino: eu lhe dei chance
Você
teve direitos , mas não quis
Do empréstimo
de vida que eu lhe fiz
Sua conta
aumentou ficou imensa
Sua felicidade
foi suspensa
E só
retorna na próxima eternidade
A velhice é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Quando
surge crepúsculo em vez de auroras
Falta
fôlego na válvula dos pulmões
Quem
foi centro de todas atenções
Onde
chega não tem quem dê as horas
No diálogo
dos genros e das noras
É motivo
de queixa e desavença
E cada
dia a matéria mais propensa
A ouvir
a extrema unção do frade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
Os mais
próximos pra longe se debandam
Sem poder
opinar na cor da tinta
Na estufa
da vida o tempo pinta
Os cabelos
na cor que os anos mandam
Se tremendo
de dor as pernas andam
Vagarosa
e sem força a mente pensa
A tristeza
é assídua na presença
E é
distante o prazer da mocidade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa
A velhice
traz desses dissabores
Corpo
esbelto com os anos fica cheio
Quem
começa bonito acaba feio
Se vão
cem alegrias, vêm mil dores
Quem
viveu convencido dos amores
Hoje
só não encontra quem convença
Do que
foi é tão grande a diferença
Que ele
próprio duvida que é verdade
A velhice
é um débito que a idade
Pode
até prorrogar, mas não dispensa