O
vendedor de Berimbau
Chico
Pedrosa
Quando
Pedro Malazarte
Resolveu
se aposentar
Mandou
chamar o juiz
E o
escrivão do lugar
E passou
o cetro a Cancão,
Caçula
de seu irmão
E chefe
político em Brasília
E Cancão
à maneira sua
Até hoje
continua,
Assessorando
a família.
Os anões
do orçamento
Foram
alunos de Cancão
Só saíram
de cenário
Quando
excederam a lição,
Coisa
que jamais um dia
Cancão
admitiria,
Era trair
seus pupilos,
Ou por
eles ser traído,
E hoje
bem mais comedido
Cultiva
novos estilos
No Vale
do São Francisco,
Residia
um seu parente,
Comerciante
ranzinza,
Pior
do que dor de dente,
Sovina
que só o cão,
Nunca
comprou um tostão,
A vendedor
viajante,
Na sua
mercearia,
Não entra
mercadoria,
Comprada
a representante.
Viajante
aqui comigo,
Num quero
nem pro café,
Quem
diz isso é Neco Pança,
Nicolau
de Canindé,
Na minha
mercearia,
Só
entra mercadoria,
Passada
por essa mão,
Daqui
vendedor num come,
Se num
quiser passar fome,
Que arrume
outra profissão.
Era assim
que Neco Pança,
Tratava
representante,
Como
em todas as camadas
Existe
gente pedante,
Neco
não era a exceção,
É a força
de expressão,
Por ser
desconhecedor,
Que entre
a oferta e a procura,
Sempre
haverá a figura
E a
força do vendedor.
Neco
Pança Nicolau,
Vende
no seu armazém
Tudo
que os outros têm
De santo
a colher de pau,
Só não
vende berimbau,
Porque
não gosta do som
Diz que
instrumento bom,
É aquele
que nem pia,
Mas tudo
acabou no dia
Que apareceu
Massilon.
Profissional
de vendas,
Traquejador,
competente,
Soube
que Seu Neco Pança,
Alem
de ser prepotente,
Nada
comprava de fora,
Massilon
disse é agora
Que eu
pego o véi Nicolau,
Ou mudo
de profissão
Eu só
digo que ele é o cão
Se num
comprar berimbeu.
Mandou
tirar de encomenda,
Dezoito
feixes de varas,
Doze
centos de cabaças,
Mil e
duzentas taquaras,
Comprou
arame na praça,
Pra cada
vara uma braça,
Mandou
descascar os paus,
Preparou
os caxixis
E fez
do jeito que bem quis
Cem dúzias
de berimbaus.
Alugou
um caminhão
Levou
na carroceria
Chegou
guardou na cidade,
Guardou
na hospedaria,
Antes
de dormir pegou
Dez berimbaus
amarrou,
Quando
o sol se fez presente
Revisou
o mostruário
Esperou
dá o horário
E foi
visitar o cliente.
Foi chegando
e foi dizendo
Bom dia
Seu Neco Pança,
Tenho
prazer de conhecê-lo
Massilon
Nunes de França,
Vim-lhe
oferecer um cento
Desse
moderno instrumento
Feito
na Guiné Bissau,
Porque
no vosso armazém
Eu já
tô vendo que num tem
O sagrado
berimbau.
Nem tem,
nem nunca vai ter
Esse
troço do capeta
Que aqui
só vende o que presta,
E por
favor num se meta
Tenha
vergonha na cara
E tire
esse feixe de vara
Da porta
de Neco Pança
Bote
esses bicho pra lá
Senão
eu chamo jajá
Meus
homens de confiança.
Mas
Seu Neco esse instrumento
Não dá
trabalho vender
É só
aprender tocar
E o
senhor pode aprender
Que ver
segure esse pau
Vá girando
o berimbau
E balançando
o caxixi
Bata
com a vara no arame
Pro senhor
ver o enxame
De gente
chegar aqui.
Já lhe
disse que não quero
E nem
estou interessado
Massilon
disse desculpe,
Té logo
e muito obrigado
Se mudar
de opinião
Eu to
ali na pensão
De Maria
Passa Fome
No oitão
da padaria
Em frente
à delegacia
No beco
do lubisome.
Massilon
viu que seu neco
Estava
quase ferrado
Quando
ele disse não quero
Abriu
a guarda coitado
Com seus
instintos malinos
Massilon
bota os meninos
Pra perturbar
Nicolau
E todo
instante um ia lá
E dizia
o senhor já
Ta vendendo
berimbau?
Fizeram
uma romaria
Que não
tinha mais tamanho
A todo
instante um rebanho
De menino
aparecia
Moleque
entrava e saía
Na maior
cara de pau
O pobre
de Nicolau
Já tava
inchando o gogó
E a cantiga era uma só
Seu
Neco tem berimbau?
Três
dias nesse rojão
Seu
Neco num aguentou
Perguntou
a um menino
Diga
quem foi que mandou
Vocês
vim me perguntar
Eu já
to pra estourar
Calma
Seu Neco um momento
É o colégio
da gente
Que nos
pede urgentemente
Esse
belíssimo instrumento
Na nossa
escola esse ano
Termina
o primeiro grau
Mil e
trezentos alunos
E o
diretor Bacurau
Acabou
de anunciar
Pra todo
mundo escutar
Quem
não quiser levar pau
Nas provas
que vai fazer
Esse
ano tem que trazer
Cada
qual um berimbau.
Como
ninguém tá disposto
A ir
até Salvador
Comprar
tantos instrumentos
Elegemos
o senhor
Para
nos oferecer isso
Porem
se o compromisso
O senhor
não assumir
Não podemos
fazer nada
Um de
nós de madrugada
A Salvador
tem que ir.
Neco
Pança disse calma
Também
num é assim não
Lembrou-se
de massilon
Que estava
na pensão
E vendo
o lucro que ia ter
Disse
eu posso fornecer
O que
estão precisando
Até o
final do mês
Eu entrego
de uma vez
Tudo
que estão procurando.
Naquele
instante Seu Neco
Que se
julgava tão bom
Acabava
de cair
No
anzol de Massilon
À noite
foi à pousada
Comprou
a berimbauzada
Que antes
não quis comprar
E numa
ganância infernal
Comprou
o material
Sem nem
sequer pechinchar.
E fez
questão de receber
Sem conferir
o produto
Agasalhou
numa sala
E ficou
aguardando o fruto
Da grande
compra que fez
Um dia,
dois, cinco, seis,
Terça,
quarta, quinta, sexta,
Até
que desconfiou
Disse
o cabra me pegou
Também
quem manda ser besta.
Nunca
mais passou ninguém
Procurando
berimbau,
O arame
enferrujou
O cupim
furou o pau
A cabaça
apodreceu
O caxixi
se rompeu
O dobrão
mudou de cor
A vara
ficou mais leve
Pra saber
que não se deve
Subestimar
vendedor.