A queda da bolsa
Zenóbio Oliveira
Muito tem se falado sobre os tais indicadores
econômicos nos últimos dias. Há uma tentativa momentosa de se pejorá-los, através
de um linguajar técnico e siglado, como se economia fosse uma entidade fantástica,
que não pode ser apreendida por nossa parca inteligência de comedores de feijão
de corda.
Aí basta que você ligue o rádio, a tevê, abra
um jornal qualquer e lá estão eles: IPCA, IPGM, INPC, IPC, PTAX, SELIC, DI,
TR...
Mas a febre do momento mesmo é a tal Bolsa de
Valores. Essa cai dia após dia. Nem juá cai desse jeito. A gente liga o rádio
e... queda da bolsa; liga a televisão e... queda da bolsa; lê o jornal e...
queda da bolsa. E é pra você ficar preocupado, porque quando a bolsa cai a
coisa vai mal, ora pois.
Aí eu me lembro que já tive essa preocupação com
a queda da bolsa, ou melhor, já tive muito cuidado, mas muito cuidado mesmo,
pra não deixá-la cair. Eu devia ter uns oito ou noves anos de idade e, todo
dia, eu ia à Ramadinha pegar o leite pra fazer o mingau da minha irmã caçula. Trazia
num vasilhame de vidro, dentro de uma bolsa de palha de carnaúba, pendurada no guidão
da velha Merck Suisse e o medo que eu
tinha da bolsa cair se justificava, pois ali estava em jogo a fome da minha irmãzinha
pequena e a integridade dos couros do meu espinhaço.
Hoje em dia não me preocupo mais com queda de
bolsa. O leite agora é vendido em saco plástico e transportado de automóvel. A outra
bolsa caindo não vai derramar o leite das nossas caçulas, então não somos nós,
os comedores de feijão, que temos que nos preocupar em costurar as aselhas
dessa bolsa, pois se cair não seremos nós a chorar o leite derramado.
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