sábado, 24 de novembro de 2012

Dois dedos de prosa


Citações
Marcos Bezerra, do Novo Jornal

Não costumo usar citações nos meus parcos escritos de linhas retas e ideias tortas. Talvez pela ignorância assumida, mas também pela absoluta incapacidade de extraí-las de minhas leituras. Não me lembro de ter lido muitos clássicos e os poucos que li, não os fiz com papel e caneta para anotar as citações. A memória falha até mesmo na lembrança do que dizem os livros, quanto mais em frases isoladas?! 
Pescando no meu cérebro de grandes proporções, no exato momento em que tento vencer esta coluna em branco, vou lembrar de duas citações. 
A primeira e mais recente citação é do Livro do Desassossego, atribuído a Bernardo Soares, um dos heterônimos do poeta português Fernando Pessoa. Soares era um humilde ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa, onde vivia sozinho, morando num quarto, entre feliz e triste por estar empregado: “Amo em todas as pessoas o não ser eu”. 
No livro, que reúne fragmentos da obra do poeta português, o organizador admite que alguns poemas e frases podem ser atribuídos ao próprio e não ao heterônimo. De qualquer maneira, considerando que foi Pessoa quem escreveu o livro, dá para se concluir que ele era mesmo uma mente tão genial quanto perturbada. A frase é válida para destacar tais condições e lembrar que, em tempos de autores de auto-ajuda vendendo milhões de exemplares com seus textos ensebados, o poeta português seria execrado. 
A segunda citação é da personagem Tieta, do livro Tieta do Agreste, de Jorge Amado, quando ela mal retorna do velório do pai e já chama o sobrinho Ricardo, com quem tinha um caso amoroso, para fornicar: “Luto de boceta é curto”. 
Não lembro quantas vezes usei a imaginação e a mão direita com esta frase... Vale esclarecer, num tempo em que  fotografia de mulher pelada era algo muito distante do universo dos meninos que chegavam à puberdade. Senti-me menos devasso no dia em que conversei com um colega jornalista, bom de prosa, e ele também confessou o uso deste artifício. 
Mas as citações estão aí e, certamente, facilitam a escrita e dão um ar de erudição ao texto. O meu, por pobre, contém normalmente frases de personagens populares que encontrei nos caminhos da vida e que cito nas minhas crônicas; outras que falei ou escutei e depois atribuí a personagens fictícios de meus minicontos. 
A liberdade poética permite, posso até torná-los (os personagens) cultos, cuspindo frases de sapiência. Uma busca no Google, que resolve qualquer problema de mente confusa, e  descubro mais de um site dedicado a citações. 
“Amor: uma perigosa doença mental”. Platão. Prefiro os personagens desbocados de Jorge Amado, que se apaixonam, amam sem medo e não se arrependem. Quem leu, sabe. Eu li e tento fazer o mesmo na minha incipiente literatura.

domingo, 18 de novembro de 2012

Palavra por palavra


CONCERTO E DISSONANTE
Genildo Costa


Nunca fui de subestimar os ensinamentos de nossos sábios pensadores. Eles, sem dúvida, não morreram de overdose. Estiveram sempre atentos e, quando saíram de cena, deixaram a tolerância, a humildade, o amor ao próximo, como parâmetros indispensáveis para a formatação do processo civilizatório. Creio que houve tempo de sobra para, desses ensinamentos, celebrar com sucesso o  inevitável espetáculo da vida.
Tenho tido, basicamente, prudência para não tornar-se intransigente e, nem tampouco, criatura de múltiplas facetas. Acredito, muito mesmo, que é possível de ser ter o mínimo de compreensão quanto a nossa milenar tarefa de continuar acreditando que ainda haverá tempo de pensar uma nova proposta de humanidade onde a vida possa ser contemplada em toda sua plenitude.
Como seria, então, o conteúdo programático dessa nova empreitada? imagino como haveria de ser, reinventar essa possibilidade de não mais ter que sacrificar o outro quando da busca de nossas comodidades. Creio que buscar subsídios para reencontrar-se pela palavra é, simplesmente, correr o risco de ser reincidente. O que se propõe é muito mais que uma releitura de tudo que aprendemos no curso de nossas vidas. O expediente de agora é de profunda perplexidade. É o devir. O ajustar-se. O não ser mais. O que nos aguarda pode ser a última oportunidade reservada para o exercício, urgente, da depuração.
Aos que antecederam ao estágio superior da barbárie, todos saíram de cena. Alguns, esporadicamente, lembrados. Outros, há tempo que transitam pelos corredores do ostracismo. Mas, sem dúvida, não se negaram a se expor com suas idéias. Fizeram-se de homens. Pagaram um preço muito alto por saber definir critérios que os levariam a outros parâmetros de civilidade. Por sinal, de convivência humanitária. Alguns desses renomados pensadores construíram a vanguarda da manutenção do status quo e a defesa intransigente da perpetuação da ordem. Da conciliação de interesses. Ou seja, é o antagonismo. O confronto das idéias. O conflito, motor da história, peça fundamental desse imenso teatro onde todos exercem, distintamente, diferentes papéis nesse tablado de ininterruptas batalhas. Que seja a nossa teimosia um mal necessário. Não tenho dúvida de que vamos ter que aprender um pouco mais para não cometer os mesmos equívocos. As mesmas contradições.
Muito oportuno a nossa quase permanência diária de se ver. De aproveitar o Estado democrático de direito com serenidade e elegância, até. Imagino que as palavras não são tão ácidas, apenas carregam consigo a ternura de alguns descaminhos que certamente nunca vou ter o privilégio e a alegria de refazê-los. Não tenho pressa. Ando taciturno. Não perdi, absolutamente, nada. Tudo outra vez sem ter que minimizar o tamanho do entusiasmo que tenho sempre quando vejo passar em pesadelos todos os dobrados e dissonantes da banda de minha revolução.














quinta-feira, 15 de novembro de 2012

VERBO AD VERBUM


Noel num vem
Zenóbio Oliveira

Im todo ano é igual
Se aprochegando o Natal
Já começa o farnizim
De avistar Papai Noel
Espirrar no meio do céu
E arrisca é dele num vim

Liás, aqui nunca vei
Esse homi de vermei
Cum saco chei de brinquedo
Só se vê mermo im retrato
E os minino do mato
Só fica chupando os dedo

Me diga, o caba que veve
Nas frialdade das neve
No mei daquelas lonjura
Que diabo vem vê pra cá?
Só se for pa esturricar
No oco dessa quintura

Ele num vem nem a pau
Um caba internacional
Um lorde da Escandinava
Custumado cum sarmão
Vai vim bater no sertão
Pra cumer preá cum fava?

Só se ele for bocó
Pra vim naquele trenó
Que nem pneu num pissui
Se nas estrada da roça
As vez inté as carroça
Se ingancha nos pidrigúi!?

Inda duvido tombem
Que os animá que ele tem
Nesses camim lhe carregue
No mei desses carrapicho
Só sendo que aqueles bicho
Vai ter os casco dum jegue

O natal de nossas banda
Num tem os carrim que anda
Nem robô que conta estora
Num tem trenzim que apita
Nem as buneca bonita
Que dorme, que fala e chora

Nós tem buneca de trapo
Feita de tira e fiapo
Dos retaizim de rayon
Tem pião de aruera
E a mió roladera
De lata de mucilon

Nós tem buneco de barro
Tem as nota de cigarro
E os cachorro de areia
Tudo coisa de arremedo
Foi num foi se esfola um dedo
Chutando bola de meia

Vamo dexar de ilusão
Que o véi da televisão
Cum baiba branca na cara
Vistido de incarnado
É um atô custumado
A inganar babaquara

Não vá pensar que é quexume
Inveja, raiva, ciúme
Ou coisa de quem fuxica
Mais eu lhe digo: se aquete
Que esse veim da charrete
Só é pai de gente rica











Soneto


PAPAI  NOEL
Lenelson Piancó


Chamar-te de pai, porque deveria?
Se nem me criou nem é natural
Se apenas um dia por ano é natal
E pai que é pai, é pai todo dia

Chamar-te de pai, não sei se seria
Ao meu pai afronta do tipo "moral"
Pois pai de verdade não manda postal
Nem rouba dos filhos os sonhos que cria

Escrevo esta carta para lhe rogar
Escolha a criança sem pai pra adotar
Lhe dê um presente; a dignidade!

Nenhuma criança criada na rua
Merece presente que o tempo destrua
Mas sim o presente de um pai de verdade.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Dois dedos de prosa


NA SEARA DO CAPITÃO CAVERNA
Genildo Costa, Cantor e compositor

Um preito de gratidão....!

Não fui muito feliz quando inventei de inventar de ser devoto daqueles que conseguem tocar a vida escrevendo em versos a lida diária. Devo dizer que foi muito prazeroso para mim a oportunidade de estar tão próximo de quem acredita que a vida só é possível quando reinventada. Assim nos ensinou Cecília Meirelles. Poetisa e,acima de tudo, operária da palavra e da arte de escrever. Permaneço atento. Sempre atento e dando conta de minhas limitações. Aqui, acolá apresento sinais de maturidade por esses momentos vividos. Costumo, às vezes, até dá explicações para não ser tão inconsequente e besta.
Até que gostaria de me ver melhor quanto ao trato com a palavra, que agora mesmo se fez sentimento. Que bom seria. O que não consigo é justamente sacrificar os versos que a mim são remetidos, vez em quando. Que seja assim, até enquanto durar a nossa eterna convicção de sempre acreditar na beleza do canto que virá porque o instante existe. Não sei se alegre ou triste, só sei dizer desses raros momentos que nos faz cada vez mais rejuvenescidos. Feliz e cumpridor do dever de deixar, quando possível, muito pouco para uma geração que só estar ensaiando os primeiros passos. Muito embora tenha que sacrificar o sossego da mais singular e sincera amizade.
É como se tudo fosse passagem. E que nessa passagem, é bem provável que não haja tempo  para se completar o mais recente estágio de pulsação de nossas vidas. Apreensivo e calado começo a entender que o ofício de lapidar a pedra bruta haverá de ser sempre compromisso de alguns poucos chamados para encantar-se coletivamente. Olhar-se como o outro que é sempre, minuto a minuto, tocado pelo sentimento de saber onde quer chegar, pois a estrada é longa e o tempo parceiro de todos nós.
Não diria de léguas tiranas. Faria outra vez, e percorreria sem medo o breu de nossos caminhos. Só lamentaria, se tivesse que protocolar tudo que foi dito em meio ao silêncio que possibilitou definir o poeta como aquele que pede tão pouco para evitar sofrer excessivamente.
Claro, que sofremos e fizemos por merecer. Já fez alguns janeiros que o livro da sabedoria popular nos deixou o legado de que primeiro se deve viver que é pra depois poetar. Mais que  isso é conseguir domar a inquietação de quem pouco tem folheado as páginas de nossa literatura brasileira. Se fazer
Literato não deve ser apenas a reprodução na sua completude. Compreendo sim, mas o poder da retórica quero sempre que esteja por  perto como ferramenta de fundamental importância para quem na sua peregrinação deixa saudades e lembranças.
O que fica para os arquivos de nossa memória é, sem dúvida, alguns fragmentos desse aprendizado que ora se converte em páginas de meu diário. E que nunca possa anunciar palavras de despedidas quando há tempo esqueci de morrer porque todos os dias eu morro de saudades......!!!!





segunda-feira, 5 de novembro de 2012

VERBATIM

Rimando com
Hélio Crisanto


Entre flores, tropeços e espinhos
Vou chegando na casa dos quarenta
Nessa estrada longíqua e poeirenta
Vou cantando que nem os passarinhos
Se derrapo nas curvas dos caminhos

Não vacilo e nem perco a compostura
Enfrentando batalhas com bravura
Vou seguindo feliz na caminhada:
A marreta do tempo é tão pesada
Que a balança da vida não segura

domingo, 4 de novembro de 2012

Grandes poetas

Ao coração que sofre
Olavo Bilac

Ao coração que sofre, separado
Do teu, no exílio em que a chorar me vejo,
Não basta o afeto simples e sagrado
Com que das desventuras me protejo.

Não me basta saber que sou amado,
Nem só desejo o teu amor: desejo
Ter nos braços teu corpo delicado,
Ter na boca a doçura de teu beijo.

E as justas ambições que me consomem
Não me envergonham: pois maior baixeza
Não há que a terra pelo céu trocar;

E mais eleva o coração de um homem
Ser de homem sempre e, na maior pureza,
Ficar na terra e humanamente amar.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Poesia nordestina


Pruquê
Pompilho Diniz

Pruquê tu chora, pruquê?
Pruquê teu peito saluça
e o coração se adibruça
nos abismo do sofrê?
Tu pode me arrespondê?
Pruque tua arma suzinha
pelas estrada caminha
sem aligria mais tê?
Pruque teus óio num vê
e o coração não escuita
no sacrificio da luita
este cunvite a vivê?
Eu te prugunto, pruquê?
pruquê teus pé já sangrando
cuntinua caminhando
pela estrada do sofrê?
Pruquê tua boca só fala
das coisa triste da vida
que muita veiz esquecida
dentro do peito se cala?
quando o amô prefume exala
pruquê tu mata a simente
dessa aligria inucente
que no seu sonho se embala?
Pruquê que teu coração
é cumo um baú trancado
e dento dele guardado
só desespero e afrição
Pruquê num faiz meu irmão
uma limpeza la dento
varrendo cum pensamento
os ispim da mardição?
Pruquê tu véve agarrado
nas asa desse caixão
que carrega a assumbração
desse difunto, o passado?
Se tu já véve cansado,
interra todo o trumento
na cova do isquicimento
pra nunca mais sê lembrado
Despois disso, vem mais eu...
vem uví pelas estrada
o canto da passarada
que em seu peito imudeceu.
escuita a vóz das cascata,
chêra o prefume das mata,
óia os campo, tudo é teu...
Aprende cos passarim
que só tem vóz pra cantá
com o sor que nasce cedim
e vem teu frio esquentá
Oia as estrela...o luá...
mas antes de tú querê
isso tudo arrecebê,
Aprende primeiro a dá.