sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Palavra por palavra

DESPEDIDAS
Zenóbio Oliveira

Muitas vezes me chamam para despedidas, as alegres, mas não gosto delas, seja qual for a sua natureza. Foram tantas em minha vida, as tristes, que já poderia até ter-me acostumado. Algumas inesperadas de tal forma, que até hoje não se estabeleceram como uma verdade consciente em mim.
Por muito tempo concordei com uma asseveração popular sobre o amadurecimento da alma pela amargura, até esbarrar na primeira despedida triste e grave da minha vida para compreender que ela, essa tal amargura, é elemento que descende justamente de acontecimentos como a despedida, na genealogia geral dos sofrimentos.
Eu fujo delas.
Não quero que o momento de sua ocorrência seja o ponto de relação referencial das minhas lembranças. Não aceito que meu pensamento constitua uma simbolização imagética do seu acontecimento triste, como indício categórico da memória, porque isso toldaria cada instante da convivência predominantemente alegre que o precedeu.
Se bem que a despedida nem é tão pungente quando o apartamento não é efetivo. Hoje principalmente, pois com toda essa disponibilidade tecnológica na comunicação, as distâncias estão cada vez mais encurtadas. A mediação da palavra, escrita ou verbalizada, produz essa ilusão de constância, quando compartilhada diariamente nesses suportes virtuais. Mas uma relação, seja de qual tipo for, carece mais que isto. Necessita substancialmente da presença física, porque carrega no bojo elementos peculiares, que a palavra, por si só, não consegue traduzir. O olhar, o abraço, o carinho, por exemplo, não são coisas que possam viajar no espaço cibernético e isso faz com que a ausência do ente querido continue amargurando os corações distanciados.
Mas a despedida é doída mesmo quando é peremptória, quando termina uma relação de vida, porque transforma a esperança do reencontro em saudade irremediável.
De todo modo não sou afeito a despedidas, mesmo as que encerram a promessa do reencontro.
E me agarro na filosofia de “que a gente não precise das despedidas para lembrar o quanto gostamos de quem está perto. Que a gente não precise da saudade para lembrar o quanto gostamos de quem está longe.”
 E me valho da poesia para pedir aos meus que: “se acaso algum dia eu cismar de partir, me peça pra ficar”.


O que penso...

Ilusão e expectativa
Zenóbio Oliveira

A ilusão e a expectativa não são totalmente congêneres, embora carreguem na essência características comuns. São filhas legítimas da imaginação, são imunes à razão e inteiramente apartadas da realidade. Por isso têm o poder de envolver o coração no pano romanesco dos sonhos volúveis. Ambas podem levar ao contentamento ou à decepção, em maior ou menor grau, dependendo da construção dos nossos valores emotivos e da importância que dedicamos às situações que as envolvem. Principalmente quando fazemos das circunstâncias e das esperanças reflexos dos nossos desejos.
Apesar de possuírem relação idêntica de causa e efeito, não são coincidentes no tempo de ocorrência. A ilusão atua na situação presente, a expectativa age no porvir. A ilusão é a abstração do momento vivido, a expectativa, a promessa de realização dele.
Já tive ilusões, expectativas, ainda as tenho.
Posso dizer que as duas já me causaram prazeres minguados e frustrações desmedidas, mas que foram responsáveis pela minha evolução cognitiva e pelo estabelecimento da razão em mim. Aprendi, por exemplo, a não mais atribuir culpa a terceiros e a me retratar dos desabafos desaforados com quem nada tenha a ver com os meus desenganos. Aprendi também a administrar o desapontamento advindo delas
O aprendizado da experiência é doloroso, mas é substantivo, porque estimula a capacidade de apreensão da realidade e acura a idiossincrasia. Faz saber que é saudável ponderar ações e sentimentos e que a prudência, mesmo que não possa anular o dano, vai diminuir suas atribulações. Estimula o discernimento e a inteligência filosófica diante daquilo que nos envolve.
Não estou isento de nenhuma delas, nem de seus resultados negativos, posto que a esperança que as impulsionam é a mesma que me move. No entanto hoje sou mais resistente às suas ocorrências. Tenho ciência de suas efemeridades e de que assim como destroem a esperança também se destroem na rigorosidade do tempo, promovendo na alma a condição para a verdadeira liberdade.

Soneto

Preciso...
Zenóbio Oliveira.

Preciso que esse tempo logo passe,
Depressa que nem chuva de verão,
Pra que a saudade desse desenlace,
Não me atormente mais o coração

Preciso me esquecer de tua face,
Não lembrar teu sorriso de ilusão,
Pra que meu sonho enfim se desabrace,
Desse romance de alucinação.

Preciso que esse tempo tenha pressa,
De levar tua imagem de promessa,
Aos rincões mais remotos da lembrança,

Pra que nasça pra além dessa saudade,
Uma semente de felicidade,
Pelos canteiros de outra esperança.