segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Música nordestina

Coco do M
Autor: Jacinto Silva , Zé do Brejo
Intérprete: Khrystal

Eu sou um matuto moço
Morou no mato é madeira
Mandioca, manipuêra
Marco modo de mudar
Mandei Matias
amarrar mói de marmeleiro 
Malaquia, Marinheiro, 
mangueiro e maracujá.

Mané mandou
Maria, Matheu
Murilo mandou 
o meu martelo e meia má
E é quando canto esse coco
a minha língua treme
Quem fizer outro coco em M
Eu amarro e mando matar

Mulher maldosa, Madalena, macumbeba,
maniçoba, manipeba, 
manguito, mero e mancar
Melão maduro, morcego, 
mosquito e muro
Mofino, medo e monturo, 
mamoeiro e miramar

Mané mandou
Maria, Matheus
Murilo mandou 
o meu martelo e meia má
E quando canto esse coco
a minha língua treme
Quem fizer outro coco em M
Eu amarro e mando matar

Mestre Matoso, 
morador Mendes Medeiro
morava em Monteiro 
de milho mole, munguzá, 
malicioso, munganguento e macumbeiroEsse meu côco é maneiro mas é ruim de se cantar.

Mané mandou
Maria, Matheus
Murilo mandou o meu
martelo e meia má
E é quando canto esse coco
a minha língua treme
Quem fizer outro coco em M
Eu amarro e mando matar






Poesia Potiguar


Dores e Amores
Cid Augusto

Não conheço palavra que não corte 
Como o fio de uma velha faca cega 
Dilacerando a parte em que se esfrega 
Quando o amor se depara com a morte.

Não conheço verdade que não minta 
Nem gelo que não queime como fogo 
Quando o amor, apesar do nosso rogo, 
Nas cores da traição escolhe a tinta.

Não conheço esperança que resista 
À descrença de um sonho destruído, 
Aquele que, de alegre e colorido, 

Ganha a funesta cor da ametista. 
Mas calculo a tristeza interior 
De quem não sofreu, pois não teve amor.

Poesia Paraibana

A VELHICE
Diniz Vitorino

Exaustiva e penosa trajetória,
Missão árdua por nós quase cumprida.
Velha culta que esconde na memória
Efêmeras imagens de uma vida.

Documento perfeito duma história,
Pelo tempo contada e definida.
Resgate da dívida compulsória
Que há décadas atrás foi contraída.

Conta estúpida, perversa e esquisita,
Que com juros o mundo deposita,
Nos extratos da vida da pessoa.

Débito alto, guardado em seus arquivos,
No caderno dos saldos negativos,
Que o gerente do tempo não perdoa.

Poesia do Sertão


BIBIA DE JOÃO BRAZ
Louro Branco

Passei déis ano casado
Com Bibia de João Braz
Acochado muito mais
Do que cobra de viado
Nunca tivemo um danado
Nunca quizemo brigá
Jurei nunca laigá
Pro fim, fiquei sem muié
Que muié e cascavé
So pega sem avisá
Eu andando um certo dia
Lá pras banda de Assaré
Cheguei em casa de pé
Cacei, num achei Bibia
Preguntei a minha tia
— Cadê a minha criôla ?
A véia matuta e tola
Me dixe escorando a fonte
Bibia fugiu antonte
Cum “seu”Raimundo Carrôla
Eu dixe será possive
Bibia fez deu boi?
A véia dixe: — mai foi!
Fez um papé muito horrive
Só do desgosto que tive
O mundo ficou azul
O norte passou pro sul
Senti uma coisa choca
Que me deu uma frivioca
Do gogó pro mucumbú
Fui à mala que nós tinha
Coberta com uma estopa
Fui procurá nossa roupa
Quase caí na camarinha
Achei toda a roupa minha
Mas fartava a de Bibia
Minhas roupa sem as dela
Só se parece eu sem ela
Na cama que nóis drumia
Um parpite me bateu
Fui à outra maletinha
Inda achei a cuequinha
Dela tumá banho mais eu
Num era mais pareceu
Cum ela quando vestia
Aí, não, quase eu morria!
Pinotei pelo terreiro
Inda dei catorze cheiro
Na cueca de Bibia
Ainda fui na cancela
Da nossa roça pequena
Vi a jumenta morena
Que nóis botava água nela
Aí rescordei mais ela
Das água que nós trazia
Me deu uma agonia
Uma coisa tão nojenta
Ainda bejei a jumenta
Pensando que era Bibia
Eu padeço todo dia
É tão grande o meu martrato
Quando vô cumê um prato
Sobra o prato de Bibia
Na cama é uma agonia
Quando tem eu farta ela
Até a rede amarela
Tá pensa que tá danada
Cum eu na minha berada
Sabrando a berada dela
Pro caso dum vagabundo
Tô numa vida medonha
E aquela sem-vergonha
Sendo ruim no meio do mundo
Ai, meu Deus! Se “seu”Raimundo
Tomasse ódio de Bibia
E ela vortasse um dia
Nem que lascasse o meu nome
Do jeito que eu tô cum fome
Se ela vortasse, eu queria.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Folclo-rindo



Bastava dizer sim
Zenóbio Oliveira

O casamento tem suas propriedades multiformes. Pode ser uma solenidade glamourosa no altar da matriz, como resultado de um projeto planejado desde a infância, um ato de improviso nascido de um amor a primeira vista e também aquele evento que se realiza por uma conveniência ou uma vantagem qualquer.
O casamento no sertão da minha terra ainda possui outros aspectos peculiares, por assim dizer. Quando a família não consente a união, o rapaz rouba a moça;

_ Bastião carregou a fia de cumpade Filicodenço e botou lá na casa de Chico de Maroca!

Quando o sujeito ofende a donzela, a carabina do pai da ofendida é a principal testemunha da cerimônia. Neste caso, o casório acontece por força das circunstâncias. Isso rende uma fofoca.

_ Antonhe de Culó machucou o corte de Zefinha de Salustino e vai ter que casar obrigado pelo cano da bate-bucha do véi Salu!  

Tem os que preferem o concubinato. Tem os que se sentem mais confortáveis com um contrato conjugal, com legítima separação de bens, embora este modelo possua asseveração de direitos e deveres. Mas eu conheço gente que gosta mesmo é de casar. E casar comungando tudo. De papel passado. E como se diz cá, na nossa matutice caipirada, o negócio é botar carimbo logo nos três: no padre, no cartório e na polícia.
Décio de Pautila é, com certeza, um homem com essa – digamos – aptidão. Casou, enviuvou, casou de novo, separou, casou... E nessa brincadeira já estava casando pela oitava vez. E no alto dos seus sessenta e poucos anos.
No enlace com Maria, Décio queria apenas juntar os troços, sem aquela lengalenga dos cerimoniais. Ela porem, moça nova, exigiu todas as formalidades, principalmente a religiosa. Foi aí que quebrou o pau da vassoura, que nem dizia vovó. O velho Décio, apesar de um recordista do matrimônio, não havia estado na presença de um reverendo em nenhuma das vezes anteriores. E quando o padre fez a pergunta de praxe:
_ Senhor Décio! È de sua espontânea vontade receber dona Maria de Fátima como sua
legítima esposa, para amá-la, honrá-la e respeitá-la até que a morte os separe?
Ele respondeu:
_ O sinhô faça aí do jeito que achá mió!


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Poesia nordestina

ESPARSA
José Albano
.
Há no meu peito uma porta
A bater continuamente;
Dentro a esperança jaz morta
E o coração jaz doente.
Em toda parte onde eu ando,
ouço este ruído infindo:
São as tristezas entrando
E as alegrias saindo.

Grandes poetisas


SER MULHER
Carmen Cinira


Ser mulher não é ter nas formas de escultura,
No traço do perfil,  no corpo fascinante,
A  beleza que um dia o tempo transfigura
E um olhar deslumbrado atrai a cada instante.

Ser mulher não é só ter a graça empolgante,
O feitiço absorvente,  a lascívia e a ternura;
Ser mulher não é ter na carne provocante
A  volúpia infernal que arrasta e desfigura. . .

Ser mulher é ter na alma essa imortal beleza
De quem sabe pensar com toda a sutileza
E no próprio ideal rara virtude alcança...

É ter,  simples e pura,  os sentimentos francos. . .
E,  ainda no fulgor dos seus cabelos brancos,
Sonhar como mulher, sentir como criança!

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Música nordestina




Cheiro de nós
Flávio Leandro

Ainda sinto o cheiro bom,
Terra molhada já secou, mas inda cheira,
Menino grita pendurado na porteira,
O pai já vem trazendo o gado pra trancar.

Ainda sinto o cheiro bom,
Do fumaceiro do fogão, da laranjeira,
Onde juntava a molecada da Ribeira,
Pra ver o sol descer do céu pra descansar.

É como cheiro de paixão,
A me envolver o coração,
É como cheiro de amor,
É como o verso ponteado,
Como o sol alaranjado,
Que insiste em não se pôr.


É como casa de caboclo,
Numa sala de reboco,
Que o poeta cantou.
É como o cheiro da morena,
Linda flor de açucena,
Que em meu peito cochilou.


É como um cheiro de saudade,
Que na verdade nunca vai sair de mim,
Anda comigo desde os tempos de menino,
Acompanha o meu destino e me tão feliz assim.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

De repente o repente


A VELHICE É UM DÉBITO QUE A IDADE
PODE ATÉ PRORROGAR, MAS NÃO DISPENSA

Raimundo Nonato e Nonato Costa


Na vertente do olho a lágrima mina
E sem reserva de cálcio a junta estala
Tem a voz cavernosa quando fala
E uma letra ilegível quando assina
Quando o músculo enfraquece a pele afina
E sobre as veias o sangue se condensa
A saúde apresenta uma licença
E a beleza aposenta a vaidade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Como um Banco Central o tempo é
Todo ano pra nós libera um lote
Não aceita ninguém dando calote
Nem fazendo empréstimo de má fé
Classe média, elite ou a ralé
Todos passam no crivo da sentença
O pior reajuste o da doença
A maior inflação a da saudade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Não tem roupa que sirva como adorno
Nem sessão de botox que lhe ajude
Na CPMF da saúde
A velhice jamais faz um estorno
Da BR do fim não tem retorno
Pra idade não tem convalescença
E uma légua de tempo é tão extensa
Que uma vida só anda uma metade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Esta nossa epiderme é só a capa
Este nosso esqueleto só tem osso
Quem escapa da morte enquanto é moço
Quando chega a velhice não escapa
Quando almoça uma sopa janta papa
Olhos fundos, mãos trêmulas, pressão tensa
Tem dos filhos total indiferença
E vê dos netos desprezo e má vontade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Quanto mais a idade se prorroga
Mais ao corpo cansado Deus castiga
O perímetro do sonho o pranto irriga
E a maré da saudade nos afoga
Prao abismo sem mãos a morte joga
E sem usar compressor o tempo imprensa
Excluído da sorte de nascença
Quem se cria não tem felicidade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Taxa esdrúxula que chega a mil por cento
Sem constar em cartório o título vale
Um minuto de riso se equivale
A um dia de lágrima e sofrimento
A amnésia atacando o pensamento
Não existe remédio que lhe vença
Nossa vida longeva nem compensa
Que a saúde prescreve a validade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Para todos o tempo é um juiz
E cada réu que não tem tempo ao alcance
Vai ouvir do destino: eu lhe dei chance
Você teve direitos , mas não quis
Do empréstimo de vida que eu lhe fiz
Sua conta aumentou ficou imensa
Sua felicidade foi suspensa
E só retorna na próxima eternidade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Quando surge crepúsculo em vez de auroras
Falta fôlego na válvula dos pulmões
Quem foi centro de todas atenções
Onde chega não tem quem dê as horas
No diálogo dos genros e das noras
É motivo de queixa e desavença
E cada dia a matéria mais propensa
A ouvir a extrema unção do frade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

Os mais próximos pra longe se debandam
Sem poder opinar na cor da tinta
Na estufa da vida o tempo pinta
Os cabelos na cor que os anos mandam
Se tremendo de dor as pernas andam
Vagarosa e sem força a mente pensa
A tristeza é assídua na presença
E é distante o prazer da mocidade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa

A velhice traz desses dissabores
Corpo esbelto com os anos fica cheio
Quem começa bonito acaba feio
Se vão cem alegrias, vêm mil dores
Quem viveu convencido dos amores
Hoje só não encontra quem convença
Do que foi é tão grande a diferença
Que ele próprio duvida que é verdade
A velhice é um débito que a idade
Pode até prorrogar, mas não dispensa







quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Dois dedos de prosa


Quebra de contrato.
Zenóbio Oliveira

Pancadas sólidas no portão, nós dos dedos talvez, contra a folha de ferro galvanizado. Cocorotes, num dialeto mais rústico, mais campesino. Mas, tinha cadência. Por algum tempo até apreciei aquele ritmo, aquela musicalidade. Ocupado, entretanto, ignorei o chamado, aspirando pela desistência daquelas batidas cadentes.
Reincidiram. Teimaram.
Vencido, resolvi atender o dono do ato veemente.
Olho na lente do olho mágico...
_ Pois não!?
Homem fardado. Roupa preta, botas, quepe, cacete...
_ Senhor, faço parte do Comando Grupo Força e Vigilância Águia, proteção e socorro para as residências dessa rua aqui que o senhor mora e demais adjacências!
Ofereceu-me um monitoramento ostensivo, regulamentado por uma espécie de contrato de experiência com duração de um mês, onde eu pagaria apenas metade do valor de um acordo futuro e mais longo, se acaso ficasse satisfeito com o serviço referente àquela mensalidade, digamos, promocional.
Tencionei recusar.
O homem listou seus argumentos à minha persuasão. O histórico de arrombamentos, roubos e assaltos nessas redondezas contava a seu favor.
Fiz minha própria leitura da situação e, cotejando épocas, pude notar que os ladrões de hoje não querem apenas nossas galinhas. Os mal amados e bem armados amigos do alheio adquiriram tarimba, abriram firma, especializaram-se, como em qualquer atividade. Mão de obra qualificada, forjada desde a infância. Os meninos hodiernos não carregam baladeiras, mas pistolas automáticas. E têm um ingrediente motivacional: a droga. Pelo CRACK tornaram-se craques na arte de roubar.
O homem ostentava números comparativos, antes e depois da presença do Grupo Águia. Uma queda nos ocorridos de mais de cinqüenta por cento, garantia.
_ E então senhor, vamos assinar?
Assinei.
O tal antecontrato ganhou validade naquela mesma noite. A partir daí o meu sossego sucumbiu ao apitar grosseiro, à sirene inoportuna, à falta de estilo do guarda da motocicleta.
Passei a sonhar com o fim daquele contrato. Elegi todos os pontos negativos do acordo e ensaiei, por tempos, uma alegação capaz de confrontar os argumentos daquele homem renitente. Só que, faltando dois dias para findar a prestação do serviço, os larápios roubaram uma pia do quintal de Dona Tetê, minha vizinha.











quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Poesia nordestina


Rimando
com Manoel Xudu

Quando chega a estiagem
Nosso sertão perde o brilho
O pai por causa do filho
Vai trabalhar na rodagem
O mais velho sem coragem
Chama a mãe e pede um pão
A mãe sem ter um tostão
Abraça o filho chorando
E o vegetal se queimando
Na calma azul do sertão